Porque ele é o Hugo! E o Hugo é indomável.
“Em uma entrevista com J. K. Rowling, autora da série Harry Potter, um fã norte-americano lhe perguntou se ela algum dia escreveria um livro sobre uma escola de bruxaria nos Estados Unidos. Ela respondeu que não, ‘... mas fique à vontade para escrever o seu’”. Foi assim, sentindo-se autorizada pela própria criadora da série mais famosa de todos os tempos, que a carioca Renata Ventura decidiu escrever sobre uma escola de magia no Rio de Janeiro.
Em “A Arma Escarlate” somos apresentados à escola de magia Notre Dame Do Korkovado, ou Nossa Senhora do Korkovado, em bom português (beijo, Viny!). Uma escola que, apesar de ser de magia, está no Brasil, portanto, tem tantas falhas quanto as escolas públicas “azêmolas” do país. Somos apresentados, também, ao nosso Harry Potter: o “favelado” Hugo Escarlate.
Chamar o Hugo de “nosso Harry Potter” é covardia. A inocência que emana do bruxo inglês por boa parte da saga falta ao nosso herói, garoto nascido e criado na favela Dona Marta em seus piores dias, quando o tráfico de drogas mandava na região; abandonado pelo pai e criado pela mãe solteira e pela avó, sempre sofrendo com a falta de professores na escola pública, menino vivido e experimentado nas dores de um adulto. Um simples garoto negro de 13 anos, que viveu muito mais experiências traumáticas do que muito adulto por aí.
Mas, vamos falar do livro, tentando não dizer muita coisa para não estragar as surpresas. Renata Ventura tem uma escrita certinha, redondinha, ousaria dizer, até mesmo, impecável. A história é bem amarrada, com os ganchos certos nas horas certas, o que te deixa absolutamente grudado nas páginas. A autora criou um mundo dentro do universo de Harry Potter, de certa forma, mas, ao mesmo tempo, muito diferente. Renata esbanja criatividade nas adaptações do mundo bruxo para as terras tupiniquins. Feitiços em latim? Não, iorubá, bantu e tupi. Salgueiro Lutador? Pé de Cachimbo! Beco Diagonal? Sub Saara, meu bem! E uma escola de magia inteirinha dentro do morro do Corcovado! É difícil escrever sobre A Arma Escarlate sem contar detalhes importantes da trama, pois o livro inteiro é uma surpresa e um deleite, à medida em que se vai lendo. Mas não apenas isso...
O livro é dividido em duas partes. Na primeira parte, somos apresentados à escola, aos personagens e à história de Hugo. Porém, na segunda, o livro ganha uma nuvem negra que paira acima de cada capítulo, transformando o coração do pobre leitor em uma confusão de sentimentos por vezes conflitantes. Raiva do protagonista. Ódio do bandido. Revolta. Dor. Incredulidade. Acho que não há adjetivo melhor para definir “A Arma Escarlate” do que brutal. Ou cruel. Nunca senti tamanha angústia ao ler um livro, juro a vocês! Não era medo, nervoso, excitação, nada disso. Era choque com os rumos que as coisas tomavam, incredulidade... Uma sensação sufocante! Estou tendo até dificuldade em escrever essa resenha no momento, porque ainda não consigo respirar direito, completamente tomada pelas emoções. Não digo isso por exagero: sou uma leitora bastante crítica e uma resenhista mais ainda. Quando digo que TÔ NO CHÃO, ROSANAAAAA! É porque estou no chão meeeeesmo!
Mas não se enganem, nada disso é uma crítica ruim. Muito pelo contrário! O livro é genial, incrível e está totalmente à altura da saga de J. K. Rowling. São mundos completamente diferentes, mas a “destruidora de corações”, como é considerada pela sua legião de fãs, conseguiu criar o seu com charme, criatividade e muito talento. O mundo mágico e brutal de Hugo Escarlate já entrou para a história das sagas inesquecíveis, tanto nacionais quanto internacionais. Não vou dizer “você que é fã de Harry Potter, leia esse livro”, não mesmo! Porque você não vai encontrar o mesmo mundo encantado da história inglesa. Você não vai encontrar o menino Harry, órfão inocente. Aqui é a terra do Pequeno Obá, de Hugo Escarlate. E o Hugo é indomável.
Minha classificação para esse livro é de ❤ 6/6- "Obra Prima".
A Arma Escarlate. Ventura, Renata. Editora Novo Século, 2012, 488 p.